sexta-feira, 21 de maio de 2010

Ave!

Ave!


por todas as marias do mundo, ave
pelas mulheres cheias de graça, ave
por todas as benditas mulheres, ave
pelos seus frutíferos ventres, ave
por todas as mães ardorosas, ave
pelos pais e pelos seus filhos, ave
pelos sorrisos e pelos abraços, ave
pelos apertos de mão, ave
pelo inocente olhar das crianças, ave
por todas as famílias unidas, ave
pelo trabalho e pelo descanso, ave
pelo alimento do corpo e da alma, ave
pelas tristezas e alegrias, ave
por todos os pássaros do céu, ave
pelos rios e pelas matas, ave
pelos desertos e pelos mares, ave
pelos vales e pelas montanhas, ave
pelos ventos e pela chuva, ave
pelo sol e pela lua, ave
pela natureza e as criaturas, ave
pelo bem que move a vida, ave
pela vida e pela morte, ave
por aquele que tudo criou, ave
pelas nossas orações,
ave!

Remisson Aniceto
São Paulo, 20/05/2010

quinta-feira, 20 de maio de 2010

No meio do caminho

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.


http://www.culturabrasil.pro.br/cda.htm

No meio do caminho

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

http://www.culturabrasil.pro.br/cda.htm

Poema de sete faces

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.

Fonte: http://www.algumapoesia.com.br/drummond/drummond01.htm

quarta-feira, 19 de maio de 2010

As sem-razões do amor

Eu te amo porque te amo,
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.


Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.


Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.


Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.

Fonte:
http://www.revista.agulha.nom.br/drumm3.html#assemrazoes

Poema do jornal

O fato ainda não acabou de acontecer
e já a mão nervosa do repórter
o transforma em notícia.
O marido está matando a mulher.
A mulher ensangüentada grita.
Ladrões arrombam o cofre.
A polícia dissolve o meeting.
A pena escreve.


Vem da sala de linotipos a doce música mecânica.

Fonte:

http://www.revista.agulha.nom.br/drumm2.html#poemadojornal

Poema que aconteceu

Nenhum desejo neste domingo
nenhum problema nesta vida
o mundo parou de repente
os homens ficaram calados
domingo sem fim nem começo.


A mão que escreve este poema
não sabe o que está escrevendo
mas é possível que se soubesse
nem ligasse.

http://www.revista.agulha.nom.br/drumm1.html#poemaqueaconteceu

Poema da purificação

Depois de tantos combates
o anjo bom matou o anjo mau
e jogou seu corpo no rio.


As água ficaram tintas
de um sangue que não descorava
e os peixes todos morreram.


Mas uma luz que ninguém soube
dizer de onde tinha vindo
apareceu para clarear o mundo,
e outro anjo pensou a ferida
do anjo batalhador.

Fonte:
http://www.revista.agulha.nom.br/drumm2.html#poemadapurificacao

Resíduo

(...)
Pois de tudo fica um pouco.Fica um pouco de teu queixono queixo de tua filha.De teu áspero silêncioum pouco ficou, um pouconos muros zangados,nas folhas, mudas, que sobem.
Ficou um pouco de tudono pires de porcelana,dragão partido, flor branca,ficou um poucode ruga na vossa testa,retrato.
(...) E de tudo fica um pouco.Oh abre os vidros de loçãoe abafao insuportável mau cheiro da memória.

(Resíduo)

Fonte: http://www.releituras.com/drummond_bio.asp

Carlos Drummond de Andrade (Biografia)

Carlos Drummond de Andrade nasceu em Itabira do Mato Dentro - MG, em 31 de outubro de 1902. De uma família de fazendeiros em decadência, estudou na cidade de Belo Horizonte e com os jesuítas no Colégio Anchieta de Nova Friburgo RJ, de onde foi expulso por "insubordinação mental". De novo em Belo Horizonte, começou a carreira de escritor como colaborador do Diário de Minas, que aglutinava os adeptos locais do incipiente movimento modernista mineiro.Ante a insistência familiar para que obtivesse um diploma, formou-se em farmácia na cidade de Ouro Preto em 1925. Fundou com outros escritores A Revista, que, apesar da vida breve, foi importante veículo de afirmação do modernismo em Minas. Ingressou no serviço público e, em 1934, transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde foi chefe de gabinete de Gustavo Capanema, ministro da Educação, até 1945. Passou depois a trabalhar no Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e se aposentou em 1962. Desde 1954 colaborou como cronista no Correio da Manhã e, a partir do início de 1969, no Jornal do Brasil.O modernismo não chega a ser dominante nem mesmo nos primeiros livros de Drummond, Alguma poesia (1930) e Brejo das almas (1934), em que o poema-piada e a descontração sintática pareceriam revelar o contrário. A dominante é a individualidade do autor, poeta da ordem e da consolidação, ainda que sempre, e fecundamente, contraditórias. Torturado pelo passado, assombrado com o futuro, ele se detém num presente dilacerado por este e por aquele, testemunha lúcida de si mesmo e do transcurso dos homens, de um ponto de vista melancólico e cético. Mas, enquanto ironiza os costumes e a sociedade, asperamente satírico em seu amargor e desencanto, entrega-se com empenho e requinte construtivo à comunicação estética desse modo de ser e estar.Vem daí o rigor, que beira a obsessão. O poeta trabalha sobretudo com o tempo, em sua cintilação cotidiana e subjetiva, no que destila do corrosivo. Em Sentimento do mundo (1940), em José (1942) e sobretudo em A rosa do povo (1945), Drummond lançou-se ao encontro da história contemporânea e da experiência coletiva, participando, solidarizando-se social e politicamente, descobrindo na luta a explicitação de sua mais íntima apreensão para com a vida como um todo. A surpreendente sucessão de obras-primas, nesses livros, indica a plena maturidade do poeta, mantida sempre.Várias obras do poeta foram traduzidas para o espanhol, inglês, francês, italiano, alemão, sueco, tcheco e outras línguas. Drummond foi seguramente, por muitas décadas, o poeta mais influente da literatura brasileira em seu tempo, tendo também publicado diversos livros em prosa.Em mão contrária traduziu os seguintes autores estrangeiros: Balzac (Les Paysans, 1845; Os camponeses), Choderlos de Laclos (Les Liaisons dangereuses, 1782; As relações perigosas), Marcel Proust (La Fugitive, 1925; A fugitiva), García Lorca (Doña Rosita, la soltera o el lenguaje de las flores, 1935; Dona Rosita, a solteira), François Mauriac (Thérèse Desqueyroux, 1927; Uma gota de veneno) e Molière (Les Fourberies de Scapin, 1677; Artimanhas de Scapino).Alvo de admiração irrestrita, tanto pela obra quanto pelo seu comportamento como escritor, Carlos Drummond de Andrade morreu no Rio de Janeiro RJ, no dia 17 de agosto de 1987, poucos dias após a morte de sua filha única, a cronista Maria Julieta Drummond de Andrade.

Fonte: Projeto Releituras
http://www.releituras.com/drummond_bio.asp